A pandemia da notícia

Em 1938, cerca de 1,2 milhão de pessoas acreditaram e 500 mil tiveram certeza de que estava acontecendo um perigo iminente para os Estados Unidos da América e entraram em pânico por uma suposta invasão alienígena. Na verdade não passava de uma extraordinária dramatização, através do rádio, do então jovem ator Orson Welles, do romance de ficção científica The War of the World - A guerra dos Mundos, escrito em 1897 pelo escritor britânico Herbert George Wells. Seis milhões de pessoas sintonizaram o programa e o caos paralisou três cidades.

Lembrei-me deste episódio histórico pelo, a meu ver, nexo causal com o comportamento de parte da imprensa, notadamente do sistema Globo de Rádio e TV, em relação a mais uma crise sanitária que estamos enfrentando. No final daquele romance, conta-nos o autor, uma bactéria trazida pelos invasores eliminou os próprios alienígenas que não tinham adquirido imunidade à mesma.


Pois bem, parte da mídia, que reitero, em especial a Rede Globo, tem carregado perigosamente na tinta, para usar um jargão jornalístico, bombardeando 24 horas por dia os incautos ouvintes, leitores e telespectadores, principalmente estes, com uma super carga de informações sempre batendo na mesma tecla, a repetir o mantra, com notícias enviesadas para sustentar a tese da pauta, com base em entrevistas e imagens seletivas. Este campo minado por uma visão extremamente particular é tudo que a política oportunista e demagógica quer. As matérias focam somente no número de infectados e de mortes, mas dificilmente traz no seu bojo o número, por exemplo, de infectados que tiveram sintomas leves ou foram curados. Segundo informações colhidas fora da grande mídia, este número está em 80% dos casos. A divulgação destes dados é de suma importância para levar um pouco de conforto à população, para que ela possa ter mais ânimo de enfrentar o vírus. Mas está bem claro que o interesse não é levar tranquilidade, mas pânico e desespero, para que as pessoas fiquem trancafiadas em suas casas sendo bombardeadas por programas invariavelmente de péssimo gosto, como por exemplo o Big Brother, que já tem recorde histórico de audiência. O Jornal Nacional também pulou de 30 pontos em média para 35 no horário das 21 horas, segundo dados do IBOPE.


Neste infecto ambiente da nova guerra dos mundos, a mais limitada inteligência percebe que o sistema Globo de Televisão e Rádio nutre uma antipatia canina em relação ao presidente, a ponto de tratar suas falas intempestivas, é verdade, mas que nada influenciam o seu governo, como um todo, tendo o governo a aprovação da maioria dos mesmos “especialistas” que hoje criticam o presidente. O governo vinha numa toada muito boa, aprovando medidas importantes no Congresso e oferecendo à sociedade pautas de extraordinária importância, como as reformas tributárias e administrativas, por exemplo, além da inflação e juros mais baixos da história. Mas tudo isso não tem nenhuma importância para parte da grande imprensa, que prefere construir e alimentar intrigas entre o presidente e sua equipe. Foi assim com o vice-presidente Hamilton Mourão, que num primeiro momento foi picado pela mosca azul; com o ministro Sérgio Moro, que simplesmente não caiu no jogo, e agora o escolhido da vez é o ministro Mandetta, que parece foi também picado pela mosca azul.


Pois bem, neste infecto ambiente da comunicação, os fatos são vergonhosamente, perigosamente e mesquinhamente distorcidos para alimentar a “pauta" escolhida a dedo, como não deixa dúvida o uso tergiversado das orientações do diretor geral da Organização Mundial da Saúde – OMS, João Tedros Adhanom Chebreyesus, que muito ao contrário do que afirma os jornais da Globo, jamais foi taxativo na tese do confinamento total, sempre batendo na tecla de que os menos favorecidos precisam ser protegidos, mas o protocolo oficial é o mesmo desde o início da pandemia: "ampliar a comunicação dos riscos de contaminação, mapear, isolar, testar e tratar os casos de coronavírus, rastreando todos os infectados e pessoas próximas." Como está claro, não se fala, objetivamente, em confinamento geral, mas sim em isolamento, e ainda adverte o diretor: "a palavra pandemia não deve ser usada de forma descuidada ou leviana. Não há dúvida que o combate mal empregado, pode despertar medo irracional ou aceitação injustificável de que a luta acabou levando sofrimento e mortes desnecessárias". O mesmo acontece com o ministro Mandetta, que nunca falou em fechar escolas, supermercados, restaurantes e aeroportos, por exemplo; aliás, mais recentemente interpreta que proibição de aglomerações é o mesmo que confinamento geral. 


Outro fato que macula a campanha do “fique em casa” desenvolvida e sustentada pela Globo, mas com a complacência dos demais veículos, foi o silêncio sepulcral em relação a realização do carnaval na segunda quinzena de fevereiro, que aglutinou perigosamente milhões de pessoas, a considerar que todos já sabiam que o Covid-19 já circulava entre nós. Lê-se muito nas redes sociais que a referida emissora está, já há algum tempo, com sérios problemas financeiros e que o corte violento das verbas federais agravou ainda mais a situação. Pode não ser verdade, mas não enxergo outra explicação para tamanha e implacável perseguição ao presidente. Destarte, o que confirma a tese, a campanha difamatória é especificamente contra o presidente, e não contra o seu governo. 


Neste diapasão, as únicas certezas que a comunidade médica tem são de que o vírus só se propaga através de gotículas respiratórias e os cuidados já exaustivamente divulgados de lavar as mãos, não levar as mãos ao rosto, principalmente quando estiver em lugar público, manter-se distante de outras pessoas, usar sempre o álcool gel quando tocar em utensílios externos, manter as pessoas vulneráveis o mais isolados possível, etc, medidas que realmente podem mitigar a contaminação.


Os fatos recentes envolvendo o general Augusto Heleno, chefe do Gabinete de Segurança Institucional, e os mais de 500 profissionais infectados nos dois hospitais referências no Brasil e na América Latina, Sírio-Libanês e Albert Einstein, inclusive duas de suas maiores estrelas, os doutores Roberto Kalil e Raul Cutait, não nos deixa mentir, e soma-se a tudo isso ainda a contaminação do Dr. David Uip, infectologista e chefe do Centro de Contigenciamento do Coronavírus no Estado de São Paulo. Não pretendo com isso levantar qualquer questionamento a respeito da capacidade o profissionalismo dos nossos médicos e enfermeiros, mas apenas chamar a atenção ao fato de que não existe, até o momento, nenhum milagre para o enfrentamento do vírus, como a solução defendida diuturnamente pela Rede Globo de isolamento total da população.

Nos casos mais bem sucedidos, Coréia do Sul, Cingapura, Taiwan, Suécia e Japão, não houve confinamento, apenas incentivo ao distanciamento social, maximização do número de testes e isolamento dos infectados. O governo da Suécia adverte que pode tomar mais medidas caso o vírus se espalhe, mas "devem ser medidas sustentáveis, não podemos apenas dizer que tudo precisa ser fechado por vários meses", disse o epidemiologista Anders Tegnell, chefe da Agência de Saúde da Suécia (Estadão, 28/03, pág. A15). O Dr. John P. A. Ioannidis, epidemiologista e co-diretor do Stanford's Meta-Research Innovation Center, nos informa sobre um ensaio, publicado pelo site statnews.com em 17 de março, onde se vê que ainda não temos certeza sólida da taxa de mortalidade do coronavírus. Análises de algumas das melhores evidências disponíveis atualmente indicam que pode ser de 1%, ou menor. "Se este dado é verdadeiro", diz Ioannidis, "colocar o mundo em quarentena, causando tremendas consequências sociais e financeiras, pode ser completamente irracional. É como um elefante que, atacado por um gato, frustra-se, e tentando fugir do bichano, aproxima-se e despenca de um penhasco. Morre acidentalmente" (https://www.nytimes.com/2020/03/22/opinion/coronavirus-economy.html).


Se a Globo realmente quisesse ser transparente e imparcial, devia começar com os esclarecimentos dos doutores David Uip e, principalmente, do seu contratado, Dráuzio Varella, que já divulgaram diferentes versões sobre a melhor maneira de enfrentar o coronavírus, além de entrevistar outros especialistas, como os epidemiologistas John P.A. Ioannidis e Anders Tegnell da Suécia, que pensam diferente e também estão embasados em dados técnicos. Por aqui temos os deputados federais Luiz Ovando do MS, médico há mais de 45 anos, e o Dr. Osmar Terra, também médico, que já se manifestaram reiteradamente de que o confinamento, ao contrário do que vende a grande mídia, piora a situação. O Dr. Osmar Terra fala com a experiência de quem enfrentou três epidemias enquanto secretário da saúde do Rio Grande do Sul: dengue, febre amarela e gripe suína - H1N1. Ambos afirmam com muita convicção que a contaminação só vai diminuir quando, pelo menos, 50% da população estiver infectada, e este tem de ser o caminho natural para se gerar anticorpos. Segundo o Dr. Osmar, a epidemia do Covi-19 vai ser infinitamente menos letal do que foi a da influenza, que matou 40 mil americanos no inverno passado, por exemplo. A Argentina, nos conta o deputado, que nos deu uma bola nas costas na epidemia do H1N1 - gripe suína, pois, por força das eleições, irresponsavelmente não nos avisou, sofreu a maior taxa de mortalidade do mundo. Informa ainda que os casos explodiram na Itália apesar de ter a quarentena mais feroz, com até o exército nas ruas para proibir a circulação das pessoas e a abertura do comércio. E por quê explodiu? Responde-nos o deputado: porque trancaram os assintomáticos, que têm anticorpos, no mesmo ambiente das pessoas do grupo de risco. Ele arrisca dizer que no Brasil é bem provável que cada família já esteja convivendo com um infectado assintomático. Ele argumenta que 69% da população tem entre 20 e 50 anos, sendo que 88,46% está abaixo de 60 anos. 11,64% estão acima de 50 anos e apenas 4% estão acima de 70 anos. Portanto, a força de trabalho, 88,46% da população, que está praticamente imune, pode e deve voltar ao trabalho com tranquilidade, inclusive para produzir os anticorpos essenciais para a diminuição do contágio, apenas tomando os devidos cuidados. Segundo o deputado, 99,5% dos infectados desse grupo terão sintomas bem leves. Precisamos cuidar dos idosos e dos que estão na zona de risco, que possuem outras dificuldades mórbidas como diabetes, pressão alta, etc.


O sistema de saúde do Brasil já vem com dificuldades há muito tempo, e se transformou no maior centro de óbitos, como assustadoramente afirma o deputado Dr. Luiz Ovando, no qual a cada 3 minutos, 2 pacientes morrem nos hospitais do Brasil por algum erro. São mil casos por dia, segundo dados de 2015, sendo a terceira maior causa de morte no Brasil. Segundo ele, a OMS afirma que ir ao hospital no Brasil é mais perigoso do que viajar de avião. Aqui, reitera-se os 500 profissionais infectados nos hospitais Sírio-Libanês e Albert Einstein. Também afirma que os testes não mudarão o caminho do vírus, pois já passou a hora. Esse tipo de providência só funciona no início da epidemia, quando a quantidade de testes é de suma importância para separar os infectados do resto da população. Depois que o vírus já estiver circulando, os testes só servem para aumentar as estatísticas e trazer “alegria” aos defensores do confinamento. O período de incubação do vírus é de 12 semanas. A Globo jamais convidou o deputado Dr. Osmar Terra para participar de qualquer debate. Todas as informações citadas são de uma entrevista que o ex-ministro deu ao Grupo Bandeirantes.


A gripe espanhola durou no Brasil de outubro de 1918 até a terceira semana do mês de novembro, portanto perto de oito semanas, matando 5,5 mil pessoas e contaminando cerca de 200 mil só em São Paulo. A gripe matou o presidente eleito Rodrigues Alves, que assim como Tancredo Neves, não conseguiu tomar posse. A gripe foi como veio, escreveu Osvaldo de Andrade em suas memórias, nos conta o escritor José Roberto Walker, no artigo Como a Gripe Espanhola parou São Paulo em 1918 (Estadão – 22/03 – pág. E2). Nos tempos atuais, só a dengue afeta de 50 a 100 milhões de pessoas no mundo (Brigitte Osterth – Wade For Minds – Ciência e Saúde), sendo que no Brasil ela já matou 106 pessoas somente neste ano. Temos 185,9 casos por 100 mil habitantes. A chikungunya 5,4 e a Zica 0,66 por cada 100 mil habitantes, segundo dados do Ministério da Saúde, sem considerar outros tipos de mortes, como acidentes e homicídios, por exemplo. A febre amarela que, ressalta-se, temos vacina, no período de 2016 a 2018 acumulou 2,1 mil casos com 700 óbitos. Um fato muito grave para o sistema de saúde, a considerar que desde 1942 esta doença havia sido erradicada do país. Só a título de curiosidade, o vírus mais letal que se tem conhecimento é o Marburg, nome de uma pequena cidade alemã, onde o vírus surgiu, que tem uma taxa de mortalidade de 90% dos infectados.


É de bom alvitre ressaltar que o Brasil, em termos de estrutura para enfrentar o tratamento agudo da epidemia, pelo menos em números de leitos de UTIs, está bem mais preparado do que a Itália, que tem 0,83 leito por 100 mil habitantes, o Reino Unido, com 0,6 leito, e a França, com 1,5 leito para cada 100 mil habitantes. O Brasil tem 2,62 e só perde para a Alemanha, que tem 3,02 leitos por 100 mil habitantes. Só São Paulo tem o mesmo número de leitos da França e o dobro da Itália. A ampliação dos leitos no Brasil será maior do que a soma das ampliações dos países citados, segundo dados divulgados pelo Ministério da Saúde. O Brasil está produzindo 23 milhões de testes.
Isto posto, e por fim, é justo nesta “guerra dos mundos” da comunicação, que se valorize a cobertura de outros órgãos de imprensa que têm demonstrado equilíbrio e bom senso, como o já citado Grupo Bandeirantes e O Estado de São Paulo, que também tem feito severas críticas ao “jeitão” do presidente, mas concorda com ele sobre os exageros dos governadores em fechar aeroportos e estradas em decisões unilaterais, além de dar espaço para opiniões divergentes, como são os casos das colunas do jornalista J. R. Guzzo, mais equilibrado, e da Vera Magalhães, que não esconde o seu ódio pelo presidente.

Eu, particularmente, como já deu para perceber, concordo com a opinião do J. R. Guzzo, publicada em 29/03 com o título Opção Safada, na qual ele critica os exageros da mídia e a deturpada dicotomia entre salvar vidas e manter a economia funcionando, pois entende que as duas tarefas são indispensáveis e precisam ser obrigatoriamente executadas ao mesmo tempo, caso contrário não haverá país vivo depois do coronavírus. 

Erminio Lima Neto
Advogado, consultor institucional