A ditadura do "politicamente correto".

O poeta russo Vladimir Maiakovski, “desaparecido” pela saga bolchevique, deixou consignado um diagnóstico preciso quanto ao desfalecimento do Estado de Direito, mas que as gerações ulteriores ainda relutam em assimila-lo, porque a “defesa” daquilo que a elite esquerdista chama de dignidade da pessoa humana, tem trazido, ao longo de décadas, muitos dividendos políticos.
Escreveu o Poeta no inicio do século XX: “Na primeira noite eles se aproximam e colhem uma flor de nosso jardim, e não dizemos nada. Na segunda noite, já não se escondem, pisam as flores, matam nosso cão, e não dizemos nada. Até que um dia, o mais frágil deles, entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a lua, e, conhecendo nosso medo, arranca-nos a voz da garganta, e por que não dissemos nada, já não podemos dizer mais nada.”.
Cito esse apotegma do poeta russo, como sustentáculo para difícil missão de nadar contra a correnteza, a correr um enorme risco de ser massacrado pelo “rolo compressor” deste malfadado “politicamente correto,” a começar pelo patrulhamento irracional contra o fumo, somente contra os cigarros normais, maconha pode; contra a bebida, mesmo que consumida moderadamente, já que a lei entende que um copo de vinho no jantar deixa o incauto embriagado; contra o direito de ter uma arma para sua legítima defesa, mesmo se você for uma pessoa proba, de bons antecedentes, responsável, e, ainda, pela manifesta incapacidade do Estado de prender bandidos violentos, que azucrinam, diuturnamente, a vida da população.
Afinal somos tolhidos de nossa liberdade, porque uma elite, que invariavelmente, sobrevive as custas de Organizações Sociais, acham que somos, como um todo, culpados pelos bêbados irresponsáveis e pelos pouquíssimos acidentes domésticos com armas, apesar do esforço hercúleo, deles, para tentar provar o contrario. 
No mesmo caminho, arrisco traçar um comparativo com o excesso de  arrecadação federal, apesar da queda da produção industrial e do PIB, que superou, pela primeira vez, a marca de R$ 100 bilhões em um único mês. A princípio pode parecer assuntos completamente diferentes, mas no âmago, como procurarei demonstrar a seguir, tem a mesma motivação.
Ressalta-se, este recorde começou a ser batido já no governo FHC, que através do seu então secretário da Fazenda Everardo Maciel, emérito precursor das forças que enxergam todo o empreendedor como inimigo, que iniciou a montagem nas entranhas do governo, de uma máquina de arrecadação tributária sem precedentes, sustentadas em normas muito bem “pensadas”, para se ter acesso ilimitado a vida econômica dos contribuintes.
Esse processo, como a política econômica e a social do governo FHC,  foi muito bem aprimorados pelo governo Lula, a começar pela compra de um supercomputador, o famoso T-REX – o devastador Tiranossauro Rex – montado nos Estados Unidos, com software criado por técnicos do ITA - Instituto Tecnológico de Aeronáutica - e da Unicamp, batizado também com o sugestivo nome de Harpia; a ave de rapina mais poderosa do país, em atividade desde 2006, um verdadeiro “big brother” da vida financeira dos brasileiros, na medida em que tem capacidade de cruzar informações - com rapidez e precisão - de um número de contribuintes equivalente ao do Brasil, dos EUA e da Alemanha juntos. À época, da compra, o chefe do Departamento de Teoria da Computação do ITA, Carlos Henrique Costa Ribeiro, que coordenou uma equipe de 20 técnicos que trabalharam na elaboração do software, projeto Harpia, informou que a novidade do sistema é a capacidade que ele terá de aprender com o "comportamento" dos contribuintes para detectar irregularidades. (Folha de São Paulo, 16/10/2005)
Pois bem, aliou-se a essa arma poderosa, outra mais poderosa ainda, que é a capacidade inesgotável dos nossos governantes de plantão, de constranger cidadãos e empresas, aproveitando-se do “politicamente correto”, principalmente daqueles que estão na pirâmide mediana da sociedade, fato social anômalo, que tem sufocado a capacidade de indignação e de reação daqueles que geram e distribuem a riqueza do País.
O incauto empreendedor/contribuinte ao ser acusado reiteradamente de sonegador e de inimigo do povo, perdeu sua condição de ser parte isonômica do sistema, a ficar apenas como coadjuvante, com isso não consegue mais evitar, e reagir, aos projetos, Leis e Normas fiscais violentas, abusivas e ilegais. Esse processo tem justificado algo surrealista; na medida em que quem paga a conta, pode até ser ouvido, por força do “sistema” democrático, mas, invariavelmente, não é escutado, como já ficou devidamente comprovado nas várias tentativas de reforma tributária. Os protagonistas são, sempre, os arrecadadores (divisão do bolo) e não os contribuintes, estes são sempre tratados como coadjuvantes.  
Com efeito, aquele malfadado processo, constrangimento reiterado para diminuir a força de reação, gerou “uma insensibilidade difusa – espraiada por segmentos expressivos, quiçá majoritários, do Poder Judiciário, do Ministério Público, das Polícias, da imprensa e da sociedade civil – quanto à importância dos direitos fundamentais dos cidadãos (em geral) e dos investigados pela suposta prática de crimes, (particulares) nas palavras sábias do prof. Diogo Malan em artigo publicado no sitio jurídico – Migalhas de 2/9/08, sob o título “Os ovos da serpente”.
Continua o professor doutor em processo penal pela USP: “De fato, aparenta prevalecer na sociedade brasileira de hoje a concepção de que os direitos fundamentais, tais como o sigilo de comunicações telefônicas, são subterfúgios cujo propósito é acobertar atos criminosos, a exigir pronto sacrifício no altar da defesa social contra a criminalidade. Tal deformação cultural impede a percepção da importância desses direitos como instrumentos de proteção da cidadania contra o arbítrio, a onipotência e o exercício abusivo do poder estatal.”
Sem dúvida, um ambiente fértil para que a “serpente botasse os seus ovos”, e pior! suas crias, saudáveis e cada vez mais bem alimentadas, estão ai a envenenar os fundamentos do Estado de Direito.
Ao contrário do que muita gente imagina, até pela insensibilidade difusa, corroborado pelos recordes constantes de arrecadação, a esmagadora maioria dos contribuintes não são sonegadores, e muito menos contumaz, são vítimas da sanha arrecadatória, onde servidores do fisco, verdadeiros dominus, aplicam, a seu bel prazer, penalidades absolutamente ilegais, exageradas que contrariam normas expressas na Constituição Federal além de outras complementares como o Código de Tributário Nacional, a desprezar ainda, jurisprudência de todos os tribunais do País, notadamente  Súmulas do Supremo Tribunal Federal. Ainda que o contribuinte procure remédio junto ao Judiciário e ainda que dele obtenham resposta imediata, a vítima não consegue evitar prejuízos e muitas vezes perdem sua vida econômica, sendo nesse aspecto condenadas à morte. Quando conseguem reverter o ato de terrorismo, a injustiça, a ilegalidade, o abuso que sofreram, já é tarde demais, como nos lembra o dr. Raul Haidar, advogado tributarista, no seu excelente artigo: “Ditadura fiscal evolui para terrorismo tributário”, publicado no sitio do Consultor Jurídico em 13/02/2012.
Como exemplo apenas, cito a recente Instrução Normativa do fisco de São Paulo, de nº 19, que suspende a emissão de notas fiscais, quando o contribuinte estiver inadimplente; a Portaria CAT-95 que permite aos dominus fiscais bloquearem a inscrição estadual das empresas numa simples constatação de eventuais irregularidades e os PLs 5.080 e 5082/2009, de autoria do governo, que visam dar, ainda mais, poder aos fiscais, como a penhora administrativa. A título de informação, aos empreendedores que se sente inconformados com esta situação, esses projetos, apensados ao PL 2412/2007, se encontram na Comissão de Constituição da Câmara, tendo como relator, felizmente, o dep. Sandro Mabel PMDB/GO.  
Acrescento a este mefistofélico processo, a enorme pressão que o fisco faz em cima dos incautos contribuintes, que precisam das certidões negativas para sobreviverem, como a mais recente da Justiça do Trabalho, obrigando-os, mesmo estando em dia com o fisco, a recolherem ao caixa do governo, impostos indevidos, ou, no mínimo, discutíveis. Destarte que o STF – Supremo Tribunal Federal – já considerou inconstitucional as tais certidões, quando interferem na sobrevivência da empresa. (Súmulas nºs 70 e 547) Mas como bem disse o dr. Haidar, “Os que rasgaram a Constituição, ignoram o CTN, inventaram atos juridicamente nulos, desprezam anos e anos de jurisprudência do STJ, estes continuam dando  e gozando de todas as benesses que lhes são patrocinadas pelo conjunto das vítimas”.
Este processo surdo, pois não é visível para a sociedade, alimenta verdadeiros deuses onipotentes, que do alto do olimpo do “politicamente correto”, turbinados por incentivos de promoção e financeiros, massacram impiedosamente todos os empreendedores, mesmos os idôneos e os sobreviventes, em nome de tamanha sanha arrecadatória.
Isso tudo sem falar do paternalismo do sistema trabalhista brasileiro,  que será assunto do próximo  artigo, como demonstra estudo do prof. José Pastore, (“Pais gasta muito com seguro-desemprego - “Estadão” de 03/01/2012) que demonstra, matematicamente, que é mais vantajoso para o trabalhador ir para a economia informal, e continuar recebendo o seguro desemprego, do que procurar um emprego formal. Por isso, segundo o professor, que os gastos com o seguro desemprego aumentaram, apesar do crescimento das ofertas de emprego formal.
É de bom alvitre ressaltar que a maior parte do bolo arrecadatório vai para sustentar uma máquina onde prevalece à indolência e a ineficiência, pois sequer consegue controlar os gastos do que arrecada e ainda fomenta a desigualdade, fato que também agride a tão decantada dignidade da pessoa humana.
Neste diapasão, 0,005% da população, ou seja: 1 milhão de servidores, consomem R$. 56 bilhões que são recolhidos por 190 milhões de brasileiros. Para se ter uma ideia do que isso representa; o PAC – Programa de Aceleração do Crescimento – vai aplicar este ano em infraestrutura para todo o País, cerca de R$. 42,5 bilhões. Só com aposentadorias gastamos 5% do PIB, equivalente a 15% da arrecadação tributária, sendo que em países europeus, conhecidos pela sua generosidade com sistemas previdenciários, são gastos, em média, 2% do PIB correspondente 5% da arrecadação tributária. (“Um fundo para distribuir renda” da economista Suely Caldas – publicado no Jornal “O Estado de São Paulo” - seção Opinião de 26/02/2012)
Por tudo que foi exposto, estou convencido de que a malfadada “ditadura do politicamente correto” contribuiu, e muito, para chegarmos a este ponto. Oxalá a comprovação que chegamos a um verdadeiro Estado de Polícia, que espiona tudo e todos de forma descontrolada tal qual profetizado por George Orwell, desperte em todos os segmentos da sociedade brasileira um profundo debate acerca das múltiplas causas (doutrinária; normativa; jurisprudencial; institucional; midiática; cultural etc.) do problema, que possa fornecer o senso de perspectiva necessário para solucioná-lo. Antes que seja tarde demais. Aliás, já esta tarde.