A Comissão Especial destinada a
proferir parecer ao PL 6.814/2017 criada por ato do Presidente da Câmara dos
Deputados em agosto de 2017, depois adaptada
regimentalmente para o PL 1292/95 em
03/2018, aprovou no final de dezembro do
ano passado um relatório na forma de substitutivo ao PL 6.814/2017, sendo que o
texto-base foi aprovado um pouquinho antes do recesso de julho pelo Plenário da
Câmara, pendente ainda a votação de 23 destaques de Bancada.
O PL nº. 1.292/95 assim como o
PL 6.814/2017, tem sua origem no Senado Federal, PLS 163/95 e PLS 559/2013,
respectivamente. O PLS 163/1995 de autoria do senador Lauro Campos PT/DF, propõe
apenas duas modificações na Lei de
Licitações: a obrigatoriedade de comunicar à administração as subcontratações e
a extensão dos benefícios do reequilíbrio contratual as mesmas. Já o PLS 559 foi muito debatido no Senado,
inclusive em duas Comissões Especiais a destacar o debate na Comissão Especial
do Desenvolvimento Nacional.
Pois bem, o PL 1292/95 dormitou
nos escaninhos da Câmara por longos 25 anos e também foi muito discutido numa Comissão
Especial com foco na modernização da lei de licitações, que tinha como presidente
o então deputado Carlos Marun, PMDB/MS e como relator o deputado Mauro Heringer
PDT/MG, e teve sua ultima reunião em
03/2016, e até a pouco tempo ainda constava como ativa no calendário das
Comissões Especiais da Câmara, mas que infelizmente,
ou felizmente, empacou na Comissão de Constituição e Justiça que não conseguiu
aprovar os relatórios do deputado José Eduardo Cardoso PT/SP e do deputado
Fabio Trad PMDB/MS, que desistiu do barco em 01/2015. Interessante destacar que o deputado Trad propôs
no seu relatório o combate a corrupção através da proibição da participação de
empresas que doassem para Partidos ou candidatos ligados ao Órgão contratante,
e também privilegiou os Municípios, com até 50 mil habitantes, ao propor a aplicação da modalidade convite
para o valor de até R$. 680 mil. Aliás, não se entende o porquê da criação de
uma nova Comissão em 03/2018 para tratar do mesmo assunto, e pior! Tendo o
mesmo projeto como base: são coisas da burocracia e da democracia de Brasília.
Pois bem, em 02/2018 através de
um requerimento do deputado José Guimarães PT/CE, o PL nº. 6.814/2017 foi
apensado ao PL 1292/95, fato que influenciou a criação de uma nova Comissão
Especial em detrimento da mais antiga que foi criada em 02/2015, destinada a
proferir novo parecer sobre as mudanças na lei de licitações. Note-se
que a Comissão Especial foi criada por ato do presidente Rodrigo Maia, assinado em
08/2017, para proferir parecer a principio sobre o PL 6.814/2017 e não sobre o
PL nº. 1292/1995, sendo eleito para presidi-la o deputado Augusto Coutinho
SD/PE que convidou o deputado João Arruda, PMDB/PR, para ser o relator.
Fiz este breve histórico para
demonstrar o quanto é difícil aprovar qualquer mudança na Lei de Licitações,
como deixa claro o andamento do PL 1292 que está, reitera-se, em discussão no
Congresso há 25 anos. Todas as vezes que se tenta discutir o tema,
são apresentadas uma avalanche de pedidos de apensamento de outros projetos,
fora as emendas em números não menores. Para se ter uma ideia, ao PL 1292 foram apensados mais de 257 projetos; apresentadas 127 Emendas; 18 pareceres e 64 mensagens, ofícios e
requerimentos, que não deixam dúvidas
quanto as referidas dificuldades. Destarte que o foco maior dos projetos e
emendas é sempre na excessiva proteção à Administração Pública, em detrimento dos demais interessados, como
os fornecedores de maneira geral que são os que mais sofrem com a visão
estreita dos poderes da República, Executivo, Tribunal de Contas e Ministério
Público, que não conseguem, ou não
querem, separar o joio do trigo, fato
anômalo que sempre transforma as discussões num ambiente plúmbeo que influencia
fortemente na construção de um
projeto excessivamente burocrático que mais atrapalha do que ajuda, como
caminha a atual discussão que veremos a seguir. O PL atual tem 190 artigos!
Na verdade a Lei 8.666/93, com
as atualizações que recebeu ao longo dos seus 27 anos, como não cansa de defender
o seu autor, ex-deputado Luiz Roberto Ponte, atende perfeitamente o mercado, não
sendo ela, portanto, o problema, mas, como sempre, é o seu não cumprimento, principalmente
pelos invariavelmente, dominus gestores
públicos, a gerar uma extraordinária insegurança jurídica. Segundo o autor, “as
licitações são foco de corrupção por falta de aplicação da lei, não por
problemas no texto.” (https://www2.camara.leg.br/camaranoticias/radio/materias/RADIOAGENCIA/556046)
Neste sentido, os grupos de
interesses trabalham sempre para incluir na nova lei as dificuldades jurídicas
que encontram no dia a dia por força da relação comercial com a Administração
Pública. Cria-se, portanto, uma verdadeira anomalia, que é tentar colocar na
nova lei, tudo aquilo que não é observado no diploma legal que se quer
modificar. Tudo isso fomentado, é óbvio, pelos muitos interesses em jogo. A Administração
Pública segundo dados do Ministério do Planejamento de 2016, gastou com contratações cerca de R$ 47 bilhões
a empregar cerca de 100 mil
trabalhadores.
Pois bem, o Substitutivo
aprovado no Plenário da Câmara, não foge
a regra de não conseguir eliminar a excessiva burocracia e controles, mas contraditoriamente, o relatório com o argumento de dar maior
fluidez ao processo, mantém no seu bojo muito do DNA da Operação Lava Jato, pois o PL
nº. 6814/2017 nasceu com a Medida Provisória 630/2013 da lavra da então
ministra Gleisi Hoffman, que voltou, à época, ao Senado para liderar o
encaminhamento da proposta naquela Casa, que tinha como objetivo simplesmente estender
a todas as licitações o regime diferenciado de contratação (RDC) implementado
para as malfadadas obras da Copa do Mundo e dos Jogos Olímpicos.
Felizmente os Senadores da
oposição, à época, com o apoio de alguns da base do governo, mudaram estrategicamente
o rumo da referida MP ao transferirem a maior parte dos seus artigos para o PLS
559/2013, oriundo de uma Comissão Especial que teve como relatora a senadora
Katia Abreu, então do PMDB, tendo como relator final na Comissão Especial do
Desenvolvimento Nacional, o senador Fernando Bezerra Coelho, MDB/PE. Este
“surdo” e importante fato para a história da política brasileira, enfraqueceu a estratégia do PT de sustentar o relacionamento espúrio com as empreiteiras, como
foi desmascarado mais tarde pela Operação Lava Jato, tendo como objetivo a sua perpetuação
no poder, pois as grandes construtoras seriam, mais ainda, as maiores
beneficiados, daí se explica a iniciativa do deputado José Guimarães PT/CE para
apensar o PL nº. 6.814/2017 (PLS 559/2013) ao PL 1292/95, o que de certa forma
logrou êxito, pois a base do substitutivo em discussão é o PL 6.814/2017, daí o
DNA da Lava Jato. Apenas a titulo de informação, a MP 630/2013
foi aprovada em maio de 2014, mas limitou-se à aplicação do RDC para as obras de presídios.
Desta forma, vários artigos que
constavam da MP continuam no texto atual, como o excesso de poder
discricionário dos agentes públicos, que terão o poder de comandar a licitação
da maneira que melhor entender, a considerar que o projeto deixa tudo, o quase
tudo, no condicional: se vai ter pregão ou não; se vai ter pré-qualificação ou
não; que tipo de garantia vai ser aplicada, só para citar três exemplos, mas
vale a pena também chamar à atenção os vários regimes de empreitada para obras
e serviços de engenharia: integral; por tarefa; contratação integrada;
semi-integrada e fornecimento e prestação de serviço associado, com a
possibilidade ainda, reitera-se, de incluir o fornecimento das instalações e dos serviços,
que, aliás, foi incluído no texto do
Senado e mantido no substitutivo, através de uma emenda da ex-senadora, atual deputada e presidente do PT.
Não há dúvida de que o super
poder dos agentes estabelecidos no projeto,
ao contrário do que imaginam os defensores da “flexibilidade e
agilidade” engessará ainda mais o processo, a considerar que os nossos zelosos agentes públicos, normalmente decidem
com os olhos voltados para os órgãos de controle, e estes,
por sua vez, invariavelmente, só se preocupam com os cumprimentos dos atos
formais do processo em detrimento da qualidade do objeto da contratação, agravado
pela excessiva demora das auditorias, o que dificulta, e muito, a defesa dos
agentes públicos.
Neste diapasão, os responsáveis
pela licitação optam sempre pelo mais confortável; pra eles, que é a contratação pelo menor preço
e não pelo melhor preço, que mascara a contratação pelo viés de uma falsa
economia, tendo em vista que este tipo de contratação traz no seu bojo um custo
oculto que se transforma num inferno para o dia a dia dos gestores do contrato,
que normalmente, pela opção pelo menor preço, recebem um péssimo serviço, uma obra de má
qualidade ou inacabada ou um produto genérico, processo que leva
invariavelmente ao término intempestivo, e conflituoso, do
contrato, a se transformar a eventual economia pela contratação pelo
menor preço num valor astronômico de prejuízo e de dor de cabeça para à
Administração Pública.
Por fim, é de bom alvitre
ressaltar que o setor mais prejudicado, e pela nova proposta aumentará o sofrimento, é o
setor de serviços com predominância de mão de obra, a considerar que seu maior insumo e o mais sensível,
não só para Administração Pública
contratante mas para a sociedade como um todo, é o ser humano, que acaba assumindo o prejuízo
mais cruel, que é o não recebimento dos seus direitos, pela obrigatoriedade da
aventura da contratação através do
Pregão eletrônico, tipo de licitação que virou um verdadeiro cassino, tendo em
vista que os licitantes não tem cara, é tudo virtual, o que facilita o gestor público só optar pelo menor preço. Este
maléfico processo; trata da mesma forma a
compra de uma simples lápis e a
contratação de serviços, onde 80% do preço se destina a remuneração dos
trabalhadores.
Esse mefistofélico processo, tem sito o maior problema para as contratações
na Administração Pública, onde o foco é sempre o menor preço em detrimento do
melhor preço, que são conceitos diferentes. O melhor preço pode até ser o menor preço, mas entre produtos e serviços da mesma qualidade, e
o projeto em discussão na Câmara dos Deputados dispensou “olhar de paisagem” a
esta questão, fundamental para que o Estado receba um produto, uma obra ou
serviços de melhor qualidade, pior, afasta as empresas idôneas, que não
conseguem mais competir no mercado.
Ermínio Lima Neto
Advogado,
consultor empresarial e institucional.
0 comentários:
Postar um comentário